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Balcão do Advogado: Cerveja no tribunal – Casos Petroleum e Helles

Recentemente, dois processos judiciais envolvendo cervejarias tiveram grandes reviravoltas. Trata-se dos casos envolvendo a cerveja “Petroleum”, movida pelos sócios da Dum Cervejaria contra a Cervejaria ZX (braço de inovação da Ambev), e o estilo “Helles”, ajuizada pela Cervejaria Fassbier contra a Abadessa.

Não é comum cervejarias terem disputas nos tribunais, por isso é importante entender o que levou as cervejarias a acionarem o Judiciário e quais os desfechos, tanto para evitar conflitos judiciais, como para estimular soluções não litigiosas.

CASO DUM PETROLEUM
Em 2015, os sócios da Dum Cervejaria ajuizaram ação judicial contra as empresas Tropical Juice e Cervejaria ZX (que substituiu a Cervejaria Wäls), pleiteando rescisão do contrato de compra e venda envolvendo a exploração da receita da cerveja “Petroleum”.

No contrato, a Wäls comprou da Dum o direito de usar uma receita da Petroleum para fabricar, vender e registrar produtos com essa fórmula. Esse acordo garantia que ambas as empresas pudessem usar a receita, mantendo o sigilo da fórmula apenas entre os contratantes.

Os sócios da Dum alegaram que os pais dos antigos sócios da Wäls começaram a usar a receita da Petroleum na sua cervejaria nos Estados Unidos, a Novo Brazil Brewing Co., mas com outro nome. Isso foi interpretado pelos autores da ação como uma violação do acordo, pois a receita secreta foi compartilhada com terceiros.

 Além disso, havia um acordo de que, se a Wäls superasse o limite anual de cem mil litros de cerveja usando a receita, eles teriam que pagar mais aos vendedores.

Por essas razões, os autores ajuizaram a ação buscando a rescisão do contrato, a restituição de valores e o pagamento de multa contratual.

A sentença condenou os réus ao pagamento de R$ 500 mil por quebra de sigilo da fórmula da cerveja Petroleum.

A Cervejaria ZX recorreu da decisão e, em segunda instância, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais acolheu o recurso por falta de prova técnica que comprovasse o uso indevido, bem como por entender que o juiz de primeiro grau se equivocou ao afirmar que a ré não impugnou a alegação referente ao uso indevido da fórmula, o que de fato havia feito na sua contestação.

Os autores tentaram ainda recorrer ao STJ, mas sem sucesso.

Desse caso, é possível extrair algumas reflexões:

1 – Para ingressar com ação judicial relacionada ao uso indevido de receita de cerveja é necessário ter laudos e provas técnicas que comprovem que as cervejas são idênticas, o que é extremamente difícil de ser feito, considerando as quase infinitas variáveis que existem no processo de produção de cerveja.

2 – Processar um grande conglomerado cervejeiro sempre será muito mais difícil, já que, no geral, o grande poderio econômico se reflete em defesa de alta qualidade em todas as instâncias.

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3 – O Judiciário está abarrotado de ações, o que torna qualquer processo lento e custoso. Somado a isso, ações que versam sobre questões totalmente atípicas, sobre as quais o julgador não possui absolutamente nenhum conhecimento (produção de cerveja), sempre envolvem um risco muito maior, ainda mais sem provas e pareceres técnicos.

CASO HELLES
A cervejaria Fassbier, de Caxias do Sul, depositou o estilo de cerveja alemão “Helles” como marca nominativa no INPI em 2004. O registro da marca foi concedido à cervejaria em 2007 e renovado por mais 10 anos em 2017.

Em abril de 2019, a Fassbier enviou notificações extrajudiciais a algumas cervejarias do Rio Grande do Sul que produzem o estilo Helles, solicitando que cessassem o uso da “marca Helles” e indenizassem a cervejaria “proprietária” da marca pelo seu “uso indevido”.

No dia 10 de junho de 2019, a Fassbier ajuizou “ação para proibição de ato ilícito cumulada com reparação de danos” contra a cervejaria Abadessa, na qual a cervejaria de Caxias postulou a proibição da comercialização da cerveja com a “marca Helles”, além de indenização por danos materiais e morais.

Em primeira instância, a sentença julgou parcialmente procedente a ação de indenização, determinando que a Cervejaria Abadessa se abstivesse de produzir e comercializar produtos contendo a “marca Helles”, sob pena de multa de R$ 10 mil, bem como para condenar a Abadessa a indenizar materialmente a Fassbier.

A Cervejaria Abadessa recorreu da decisão e a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul deu provimento ao recurso liberando o uso do referido estilo pela Abadessa.

O desembargador relator do caso, Niwton Carpes da Silva, entendeu que “Helles se trata de expressão que não possui a originalidade necessária a ponto de se obrigar as demais empresas do ramo cervejeiro de abstenção do uso comercial, sendo cabível a mitigação da exclusividade do registro, o que também afasta de imediato a pretensão indenizatória”.

A decisão foi unânime e uma nova reviravolta é improvável. No momento a Cervejaria Fassbier tenta recorrer ao STJ.

É precedente importantíssimo para o mercado cervejeiro, já que possibilita o uso do estilo Helles sem qualquer temor de retaliação pela Cervejaria Fassbier, detentora da marca no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). Bem assim, a decisão também tem um importante efeito indireto dissuasório, no sentido de desencorajar que outras cervejarias tentem registrar estilos de cerveja como marca com o intuito de impedir concorrentes de usá-los.


André Lopes é sócio do escritório Lopes, Verdi & Távora Advogados e criadores do site Advogado Cervejeiro.

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