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Falta de insumos: Maior crise em décadas dificulta retomada do setor cervejeiro

Cervejeiros apontam que a crise do coronavírus colocou em patamares diferentes a busca pelos insumos e a produção

Os efeitos da paralisação da atividade industrial nos primeiros meses da pandemia do coronavírus no Brasil têm provocado um cenário complicado para o setor cervejeiro nacional às vésperas das festas de fim de ano e do verão. A quebra da cadeia produtiva vem dificultando a operação das cervejarias, que sofrem com a falta de insumos para a operação, como garrafas e latas para envase, além de caixas de papelão, necessárias para a produção de kits, e para a criação de novos rótulos.

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Porém, mais do que apenas um problema localizado do setor cervejeiro, a dificuldade de acesso a alguns insumos também atinge outro segmentos da indústria nacional. A avaliação é de que o freio imposto pela pandemia, com a paralisação de operações, ainda reflete na produção, que está abaixo dos níveis exigidos para esse momento de retomada das compras.

“A dificuldade está em outros setores também.  Parece que os fabricantes pararam tudo no início da pandemia e na retomada não esperavam esta demanda”, avalia Gilberto Tarantino, sócio da cervejaria paulistana Tarantino, em entrevista ao Guia.

Para Abrahão Paes Filho, fundador e presidente da Cervejaria Santa Catarina, o cenário de falta de insumos é o mais crítico das últimas três décadas no Brasil, não ocorrendo algo parecido desde o Plano Collor em 1990. E isso dificulta o escoamento da produção, pela falta de matéria-prima.

Temos cervejas nos tanques, mas não conseguimos garrafas o suficiente para envasar. Além da falta de garrafas, também estão com falta de caixas de papelão e rótulos

– Abrahão Paes Filho, fundador e presidente da Cervejaria Santa Catarina

“No início da pandemia desligamos as máquinas, assim como fizeram também as indústrias de insumos. Quando começou a abertura do mercado em junho, as negociações começaram a voltar de forma muito tímida. Porém, no início de setembro houve uma explosão de pedidos, não só para o setor cervejeiro, mas para diversos setores”, acrescenta Abrahão.

Além disso, uma especificidade tem atrapalhado as operações e o atendimento das demandas cervejeiras: sabedores de que há uma maior busca por garrafas no fim do ano, seus produtores tradicionalmente as fabricam em quantidade maior meses antes, para atender essa procura posterior.

Só que essa produção para estocagem não foi realizada em 2020. Ao contrário: as atividades estavam paralisadas no período que isso tradicionalmente acontece, como destaca Marcelo Paixão, presidente do conselho da Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva).

“Tem uma escassez no mercado. A falta de produtos como garrafa no fim do ano até é comum. Mas, nesse ano, há zero produto. Hoje só têm três fábricas de garrafa no Brasil. E com todos os insumos é a mesma coisa. Eles produzem no meio do ano para cobrir a demanda excessiva do fim do ano. Só que em 2020 as fábricas fecharam por causa da pandemia, então não havia estoque preparado”, aponta o presidente do conselho da Abracerva.

Na sua avaliação, a origem do problema para outros insumos não está propriamente na fabricação, mas em uma etapa anterior: a falta de matéria-prima. “Para papelão, embalagens, o problema não é a fábrica. Mas que eles não conseguem comprar a matéria-prima para fazer o produto. A commodity parou de ser produzida quando a pandemia começou. É um problema muito grave. As fábricas de commodity pararam. E agora você tem uma cadeia inteira sofrendo”, acrescenta Marcelo.

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Sócio-fundador da Cervejaria MinduBier, de Salvador, Gustavo Martins tem uma avaliação parecida. Para ele, a crise do coronavírus colocou em patamares diferentes a busca pelos insumos e a produção, principalmente no caso das embalagens. Algo que, em sua visão, só com o passar do tempo será resolvido. Enquanto isso, resta lidar com esse desafio extra.

“A pandemia desestruturou completamente a lei da oferta e demanda, que estava, de certa forma, mantendo certa estabilidade. Como os compradores diminuíram ou cancelaram seus contratos, as indústrias diminuíram consideravelmente o volume de produções, para poder sobreviver à crise”, avalia Gustavo. “No momento atual, estamos começando a retomar o consumo e os volumes de produção anteriores, porém a indústria de embalagens não conseguiu se preparar a tempo.”

Desafios e soluções
Diante da falta de produtos, as cervejarias vêm sofrendo para encontrar insumos. E, quando os encontra, há dois desafios: a demora para a entrega e a cobrança de preços elevados. “Estou sabendo de colegas que estão tendo problemas com caixas de papelão e até copos descartáveis. Os fabricantes têm pedido prazos absurdos, de até 120 dias para entregar, e aumentos também absurdos, de até 80%”, explica Mario Jorge Lima, sócio-fundador da Matisse, cervejaria de Niterói que também sofreu recentemente com a falta de garrafas de vidro para envasar a sua produção, mesmo operando com pequenas quantidades.

Algumas cervejarias ouvidas pelo Guia apostam que a falta de insumos é um problema temporário. E, para resolvê-lo, vêm buscando soluções em um momento do calendário em que a procura por cerveja costuma ser maior. “Estamos buscando novos fornecedores e usando a rede de contatos para repor caixas de papelão e latas”, afirma Giba Tarantino.

Outros destacam que algumas fábricas têm se voltado ao mercado externo, com a importação de produtos. “Estou apostando que é um problema passageiro e logo o mercado se ajusta. Acredito que a importação em breve vai resolver isso, como já está ocorrendo com as garrafas de vidro importadas da Argentina”, argumenta Mario Jorge.

Embora o fim de 2020 tenha somado uma série de fatores que têm atrapalhado as operações, casos da pandemia do coronavírus, da lenta retomada da atividade industrial e da alta do dólar, lideranças do setor reconhecem que a escassez de alguns insumos já havia ocorrido em anos anteriores, ainda que sem a gravidade atual.

Esse cenário também foi percebido pela Abracerva. E, preocupada em evitar a sua repetição nos próximos anos, a associação tem buscado dialogar com os fornecedores para facilitar o atendimento das demandas pelos suprimentos no futuro próximo.

“A sazonalidade e a falta de produtos já vêm de algum tempo. A Abracerva vem conversando com esses fornecedores, passando o que o mercado vai demandar para entender o ano que vem. Alguns produtos voltarão ao normal. Outros, como as garrafas, estamos levantando os números do que o mercado consome para passar aos fornecedores e entender como vai ser o ano que vem”, detalha o presidente do Conselho da Abracerva.

Já o fundador e presidente da Cerveja Santa Catarina não crê na normalização do fornecimento de insumos antes do carnaval no Brasil. Mas, em busca de soluções imediatas para a resolução dos impasses, ele crê que o setor pode ter aprendido uma alternativa para lidar com os atuais problemas: o trabalho em conjunto, exemplificado por negociações coletivas.

“Para minimizar estes efeitos, além de mudanças temporárias ou permanentes nos vasilhames de alguns produtos, também temos trocado informações com os parceiros de microcervejarias. Mesmo que associados estávamos individualistas, então se tornou um grande momento para as pequenas cervejarias repensarem o modelo de abastecimento de insumos com cooperação”, conclui Paes Filho.

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