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Cade proíbe acordos de exclusividade da Ambev e limita Heineken

Medida vale para pontos de venda de cerveja gelada, para consumo imediato no local

A Ambev está proibida de fechar novos contratos de exclusividade com bares, restaurantes e casas noturnas. A decisão foi tomada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e tem validade até o término da Copa do Mundo no Catar, em 18 de dezembro. A determinação também terá efeito sobre o Grupo Heineken, o impedindo de firmar novos acordos nas localidades em que seus contratos de exclusividade já extrapolem o limite de 20%.

A decisão é de Gustavo Augusto, conselheiro do Cade. Ele definiu que além de estar impedida de fechar novos contratos, a Ambev precisará fazer ajustes contratuais com pontos de venda, se limitando a ter 20% de acordos de exclusividade do canal frio, em termos de PDVs e volume, segundo as bases territoriais.

Ou seja, a partir dessa decisão, apenas 20% dos bares, restaurantes e casas noturnas que façam vendas de cervejas da Ambev poderão ter acordos de exclusividade. Nos demais, deverá ser permitida a venda de cervejas de outras marcas.

Leia também – Dossiê Cade: entenda acusação sobre exclusividade que opõe Ambev e Heineken

O limite territorial para cálculo do porcentual de contratos de exclusividade foi definido de acordo com o tamanho das cidades. Para aquelas com mais de 1 milhão de habitantes, os limites serão por conjunto de bairros. Nas cidades entre 200 mil e 1 milhão de habitantes, o limite é por cidade. Nas cidades com menos de 200 mil habitantes, o limite será por estado. Já cidades turísticas terão limites por município, independentemente da população.

A decisão também atinge a cláusula de contratos que davam à Ambev direitos de preferência ou de exclusividade em relação a pontos de venda futuros ou a serem abertos, “entendendo que tal cláusula é abusiva e foi justificada pela regra da razão, importando em simples fechamento do mercado futuro.”

A liminar concedida pelo Cade também não permite que o Grupo Heineken ultrapasse os 20% de acordos de exclusividade por região dentro do mesmo prazo, o encerramento da Copa do Mundo, mas permite que a companhia firme novos acordos em localidades onde esse porcentual for inferior.

Ainda que o Grupo Heineken também seja atingido pela determinação, a decisão atende pedido da multinacional de origem holandesa. A companhia havia entrado com uma ação, em março, junto ao Cade, alegando que a Ambev cometia infrações ao direito de concorrência ao pagar e dar descontos para os pontos comerciais não venderem as marcas de cerveja das suas concorrentes em contratos de exclusividade firmados em pontos de venda premium do canal frio, para consumo imediato no local.

A decisão do auditor do Cade é passível de recurso. “Diante dos indícios analisados, considero haver fundado receio de que o programa de exclusividade da Representada possa causar lesão irreparável ou de difícil reparação ao mercado e aos consumidores”, afirma Gustavo Augusto, para justificar a adoção de uma medida preventiva.

O relator do caso solicitou ainda a elaboração de estudos pelo Departamento de Estudos Econômicos, para verificar se o porcentual de 20% deverá ser mantido ou se deve ser estabelecido um limite mais restritivo.

As empresas terão agora 30 dias para apresentarem a lista dos estabelecimentos com os quais possuem contrato de exclusividade. Em caso de descumprimento da decisão, será aplicada multa de R$ 1 milhão por dia, além da possibilidade de suspensão dos contratos de exclusividade por até cinco anos. A medida valerá até o trânsito em julgado do processo administrativo ou até nova decisão do tribunal do Cade.

O que balizou a decisão
Para tomar a decisão, o conselheiro do Cade apontou considerar plausível que contratos de exclusividade de venda de cerveja gelada em bares, restaurantes e casas de shows podem causar prejuízos ao consumidor quando firmados em pequenas regiões ou em nichos de mercado.

“Hipótese na qual a substituição se torna pouco provável, diante de um tying effect. Essa lesão pode ser corroborada tanto pela diminuição qualitativa das suas opções de escolha como pela imposição de preços superiores aos preços que seriam obtidos em um ambiente de plena competição, notadamente diante da ausência de substituições perfeitas, nesse tipo de cenário”, diz.

Augusto afirma existir “indícios de que o programa de exclusividade da Ambev não seja aplicado de forma equânime em todas as regiões, havendo evidências mensuráveis de que a empresa provavelmente esteja focando seu programa em segmentos de mercado específicos e regiões geográficas de alta renda”, o que foi o principal alvo da reclamação do Grupo Heineken, que citou, em sua reclamação, os PDVs “premium”.

Para ele, a concentração de contratos de exclusividade em regiões específicas pode configurar uma lesão concorrencial. “Conquistado o bairro ou a cidade, passa-se, então, para o mercado vizinho. Paulatinamente, toda a competição poderá ser excluída, sem que os volumes totais regionais jamais sejam ultrapassados. Por tal razão, contratos de exclusividade não podem ter focados em determinados espaços geográficos, em percentual que caracterize um fechamento local dos canais de venda”, diz.

Gustavo Augusto afirma, ainda, que há indícios, de acordo sua interpretação de informações repassadas pela Ambev em suas contrarrazões, de que o programa de exclusividade da companhia possui foco maior em bairros nobres das grandes cidades, que estão incluídos no conceito de PDVs premium.

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“Quando se chega à página 31 das contrarrazões, que mostra os valores nos bairros nobres do Rio e São Paulo, os quantitativos, em número de PDVs, aumentam dramaticamente, em patamares muito superior ao da respectiva média regional. Concluo, portanto, que embora a Representada alegue que compete em raios imaginários de 500 km, parece que ela tem preferências muito claras ao focar seus programas em bairros nobres das grandes cidades, contrariando os argumentos econômicos por ela mesmo levantados”, escreve.

O conselheiro do Cade também aponta potencial de prejuízo ao consumidor da cláusula nos contratos de exclusividade que abrange o direito de preferência nos pontos de venda futuros, algo que também foi alvo da sua decisão.

“Qual a eficiência econômica de tal cláusula para o consumidor final, salvo o direito de a empresa reservar para si um espaço futuro, que sequer existe, sem que invista um único centavo nesse PDV hipotético? Aqui, há uma clara teoria do dano: redes de bares e restaurantes participantes do programa e que venham a crescer estarão, no futuro, proibidas de contratar com os concorrentes, deixando o acesso aos rivais apenas aos pontos de venda que permaneçam estagnados. O efeito claro aqui é de se excluir o acesso dos concorrentes a marcas e franquias novas e promissoras”, afirma.

Conselheiro cita outros dois casos envolvendo a Ambev
Na argumentação da medida cautelar, o auditor do Cade ainda cita outros dois casos envolvendo a Ambev que foram avaliados anteriormente pela autarquia, indicando que eles foram determinantes para a sua decisão.

O primeiro deles é o caso dos Refrigeradores de Cerveja, em que a Kaiser entrou com representação em função dos acordos de exclusividade entre a Ambev e seus pontos de venda no mercado de cervejas. Nesse caso, eram fornecidos refrigeradores aos PDVs, sob a condição de que eles somente fossem utilizados para gelar as cervejas fabricadas pela Ambev.

Esse caso foi resolvido por meio de um Termo de Compromisso de Cessão, por meio do qual a Ambev se comprometeu a limitar os seus contratos de exclusividade em 8% do número dos PDVs, e a 10% do volume de vendas, apurados por macrorregiões, englobando múltiplos estados. Porém, esse TCC, firmado em 2015, expirou em 2020.

Já o outro caso investigou a existência de efeitos concorrenciais decorrentes da fidelização de pontos de vendas por meio do programa “Tô Contigo”, da Ambev. À época, o Cade entendeu que o programa era anticoncorrencial, condenando a empresa ao pagamento de multa equivalente a 2% de seu faturamento bruto, além da imediata cessação da prática. Após acordo, o caso foi encerrado com o pagamento de multa de R$ 229,1 milhões, em punição determinada em 2015.

“Registro que este Conselho já se debruçou sobre dois acordos de exclusividade realizados pela própria Ambev. E, nas duas situações, confirmou que a conduta adotada era anticompetitiva. Assim, já me parece que há, de partida, um ônus por parte da Representada de demonstrar no que o seu novo programa discrepa dos programas anteriores, explicando quais fatores lhes levam a crer que não se trata de simples reedição de infração já anteriormente cometida”, escreve o conselheiro do Cade. “O primeiro ponto que me chama a atenção, e que é bastante claro, é que a empresa Representada não conseguiu explicar no que o presente programa é melhor, ou menos nocivo, do que o ‘Tô Contigo’ ou o caso dos Refrigeradores”, acrescenta.

Entenda o caso
O caso foi iniciado em março, quando o Grupo Heineken apresentou reclamação contra a Ambev junto ao Cade. A empresa acusa a Ambev de concorrência desleal pelo modo como consegue contar com pontos de venda premium exclusivos. Em julho, então, a Superintendência Geral do Cade negou pedido de medida preventiva solicitado pela multinacional de origem holandesa para impedir a Ambev de firmar novos contratos de exclusividade com estabelecimentos comerciais classificados como premium por meio de acordos que considera serem lesivos à concorrência.

Ainda assim, o Cade acolheu o posterior pedido do Grupo Heineken para dar sequência à investigação do caso, solicitando novos posicionamentos para a multinacional de origem holandesa, assim como para a Ambev. Além disso, pediu que o Grupo Petrópolis e a Estrella Galicia apresentassem suas visões sobre políticas de exclusividade em pontos de venda.

Agora, então, com o avanço das investigações, tomou uma decisão, através do auditor Gustavo Augusto que não afeta apenas a Ambev, mas também pode atingir o Grupo Heineken.

Como as marcas se posicionam
Procuradas pela reportagem do Guia, as empresas apresentaram seus posicionamentos. E a Ambev prometeu tomar as “medidas cabíveis” contra a decisão, indicando que deverá apresentar recurso diante do que foi determinado pelo auditor do Cade.

“Recebemos com total surpresa a decisão monocrática divulgada hoje (quinta-feira), especialmente depois da Superintendência-Geral do Cade ter concluído que não havia qualquer evidência para impor medida preventiva. Tomaremos as medidas cabíveis. Na Ambev respeitamos a legislação brasileira com seriedade”, disse a Ambev, em posicionamento enviado à reportagem do Guia.

Por sua vez, o Grupo Heineken classificou a decisão como um “primeiro passo” para o que chamou de “abertura do mercado”. “O Grupo Heineken iniciou o processo junto ao Cade por acreditar em uma prática concorrencial justa e na liberdade de escolha do consumidor. A decisão estabelece a proibição da celebração de novos contratos de exclusividade e limita os já existentes da representada em todo o território nacional, assim como estabelece para o Grupo Heineken em determinadas regiões. Isso representa uma mensagem positiva e um primeiro passo fundamental para a abertura do mercado, por demonstrar um reconhecimento do Cade em relação aos malefícios das práticas abusivas de exclusividade para o setor”, afirma.

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