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Entrevista: “Queremos nos posicionar como referência em cerveja craft no Brasil”

CEO da CBCA, Gustavo Barreira aborda desafios e estratégias para consolidação da companhia no mercado cervejeiro

Ser referência em cerveja artesanal no mercado nacional. É com esse objetivo em mente que a Companhia Brasileira de Cerveja Artesanal (CBCA) atua e planeja o seu futuro, tendo a Schornstein como carro-chefe entre as suas marcas, produzidas em duas fábricas, nas cidades de Itupeva (SP) e Pomerode (SC).

Essa meta ambiciosa foi revelada Guia pelo CEO da CBCA, Gustavo Barreira, que relata inspiração em marcas de um mercado bem mais desenvolvido do que o brasileiro, o dos Estados Unidos, onde Sierra Nevada e Samuel Adams, entre outras, dividem espaço com grandes grupos cervejeiros sem perder a aura de cervejas artesanais.

É com essa expectativa que a CBCA busca se posicionar no mercado, tentando atrair uma parcela do consumidor de cervejas especiais dos grupos cervejeiros que pode trocá-las por marcas artesanais, como a Schornstein, também ajudando a ampliar o mercado desse tipo de produto, ainda reduzido no país.

Os planos e estratégias – assim como os desafios – para alcançar esse estágio no mercado foram alguns dos temas abordados pelo Guia em uma extensa entrevista com o CEO da CBCA. Nela, ele relata planos para 2024, como a oferta de títulos da empresa para investidores privados, assim como revisa passos do passado recente. Entre eles, a decisão de fechar a fábrica de Piracicaba (SP), assim como os primeiros resultados alcançados a partir da união com a Startup Brewing.

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Confira a entrevista do Guia com o CEO da CBCA, Gustavo Barreira:

Como foi o ano de 2023 para a CBCA? Foi um ano de crescimento? Em sua visão, o que impulsionou os resultados?
Foi o primeiro ano na CBCA sem nenhuma grande novidade, movimento, aquisição ou incidente. Foi o ano em que o barco que estávamos construindo entrou na água. Foi um ano em que devemos crescer o faturamento em 30%, nos aproximando dos R$ 70 milhões. Houve evolução na capacidade produtiva, teve o movimento de concentrar a produção em Itupeva e Pomerode, com o desligamento da fábrica em Piracicaba.  Foi um ano em que procuramos olhar mais para dentro e corrigir ineficiências que essa sequência de movimentos que fizemos trouxeram. Um ano de correção de processos, treinamento de pessoas e arrumação de casa.

Esse crescimento de 30% é relevante, mas também traz desafios para a CBCA. Quais vocês encararam nesse processo de expansão?
Foram vários desafios internos. Viemos de uma sequência de expansão: em 2021, crescemos 60%. Depois, 58% em 2022 e, agora, estamos crescendo 30%. Esse crescimento é bom, mas vem com desafios que acabam deixando cicatrizes no meio do caminho. Os desafios sempre envolvem o tripé pessoas, processos e sistemas. Precisamos ter pessoas boas na frente da CBCA e que já estejam no próximo nível que pretendemos alcançar. Tivemos de trazer gente boa e formar um time de primeira linha. Cada movimento trouxe um sistema diferente para dentro da CBCA. Então, tivemos um desafio em 2022, que se finalizou em 2023, que era a unificação dos sistemas, trabalhar todas as unidades num único sistema, que é o SAP.

E tem os processos, porque as fábricas têm de fabricar o mesmo produto. É o momento de padronização, de implementação de alguns pontos de controle, para dar uma sustentação ao crescimento, se não o crescimento vem de uma maneira desorganizada. E tivemos alguns problemas ao longo do caminho por imaturidades. Nós trouxemos a Deloitte, que fez um trabalho de mapeamento de processos, mostrando quais são os pontos mais críticos que temos de trabalhar. E isso já está em andamento.

Qual é o papel da Schornstein nesse crescimento da CBCA?
A Schornstein é o carro-chefe, representa 70% das vendas da CBCA, é a marca mais antiga, tem expressão nacional, uma curva de entendimento mais rápida e ganha mais visibilidade na Oktoberfest e na Festa Pomerana. É uma marca na qual apostamos em uma estratégia nacional, um crescimento em espiral, fortalecendo muito em Santa Catarina, que é o berço dela. A partir disso, começa a irradiar para os outros estados, como Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo.

Expandir o mercado e até concorrer com marcas premium das grandes cervejas têm sido um foco da CBCA com a Schornstein?
Esse é um tema que temos de tratar com muito cuidado, por algumas razões. A precificação entra como uma estratégia de entrada, mas a nossa ideia é fazer uma adaptação pegando alguns rótulos de marcas de grande porte como referência de price index. Queremos estar numa faixa de preço muito parecida com a Eisenbahn, que consideramos ser a melhor referência por uma série de similaridades: é de Blumenau, a Schornstein, de Pomerode. São pioneiras no segmento de artesanais, a Eisenbahn é até mais antiga. Ela não é, mas se comunica como uma artesanal, e nós de fato somos uma craft. O nosso movimento caminha para que nos aproximemos do nível de precificação da Eisenbahn. Temos de lembrar que a Schornstein é uma cerveja craft, é artesanal, não somos premium. Nós estamos na ponta de cima da pirâmide. Então, nosso posicionamento tem que ser de artesanal.

Como a Schornstein busca transmitir essa mensagem de ser uma marca artesanal?
Acho fundamental, sou muito focado em não perder a aura craft. Miramos muito, como exemplo, no mercado americano. Eles têm quase 10 mil cervejarias, com algumas poucas que conseguiram furar a bolha do artesanal tradicional e que continuam sendo percebidas como artesanais, mas já com uma expressão nacional e às vezes até internacional, como Samuel Adams e Sierra Nevada, mas estão longe de serem parte dos grandes grupos ou de se tornarem uma grande cervejaria. No Brasil, não vemos nenhuma cervejaria artesanal que tenha esse tipo de posicionamento, que seja percebida no nível nacional, ainda que algumas tenham chegado perto disso, como a Backer e a Santa Catarina, com a Coruja e a Saint Bier. Elas cresceram, chegaram e, por razões diversas, voltaram. Queremos nos posicionar como um player de referência em cerveja craft no Brasil. E que isso sirva também de exemplo, trazendo outros, com mais gente provocando o público a mudar o padrão de consumo. E aí a cultura craft se fortalece com o crescimento de várias cervejarias.

Você citou várias cervejarias craft que são exemplos de sucesso nos Estados Unidos, assim como de marcas brasileiras que buscaram alcançar o status que a CBCA almeja. O que vocês tiram desses casos na busca pelos seus seus objetivos?
No Brasil, existe uma dificuldade de precificação. Conforme você vai crescendo, vai começando a acessar canais em que você não é mais só regional e há um outro tipo de relacionamento, como com os supermercados. Você tem de aprender a lidar e começar a trazer profissionais que sabem trabalhar questões de precificação, de estratégia de estímulo à venda, a concorrência com os grandes players, que acaba acontecendo na gôndola do supermercado. Saber como lidar com isso e entender que nós somos pequenos, que nossa ideia não é bater de frente com os grandes. E muita coisa, infelizmente, aprendemos na prática, como a precificação que chegamos a adotar em Santa Catarina e o que nos levou a decidir pelo fechamento da unidade de Piracicaba.

A CBCA não é só a Schornstein, tanto que as outras marcas representam 30% das suas vendas. Como vocês estão lidando com essas marcas?
A Seasons é o nosso produto high-end para compor o portfólio, tem 5% do nosso faturamento. Nunca vai passar muito disso, porque é o lugar onde a marca se posiciona, é o tamanho desse público. E atuamos como se ela tivesse uma fábrica dentro da CBCA. Nos seus fermentadores, a inovação está liberada.

A Leuven tem a história mais interessante, mas menos linear de todas as marcas. Nasceu em 2010, com quatro produtos. Em 2015, quando chegamos na sociedade, com a reinvenção da marca, passou por mudança de rótulo, veio a pegada dos personagens e da realidade aumentada. Teve a fábrica, depois fechou. Ela representa a luta que é o segmento de cerveja artesanal. É uma marca que fala muito bem na cidade de São Paulo e no interior de São Paulo, principalmente, com potencial de crescimento.

A Unicorn é uma gratíssima surpresa, veio junto com o pacote da Startup. Tem uma penetração e um nível de aceitação na cidade de São Paulo altíssimo, com um produto, a NEIPA, que é o seu carro-chefe, como uma relação custo-benefício sensacional. Representa 10% das vendas da CBCA. Enxergamos com potencial de ganhar uma escalabilidade de nível nacional, pois tem uma linguagem fácil, é uma marca também de fácil entendimento e com um portfólio de estilos que são os mais vendidos, tendo uma conexão legal com o público.

Há cerca de um ano e meio, a CBCA passou por uma união com a Startup Brewing, assumindo a fábrica de Itupeva e a própria Unicorn. Quais são os resultados desse processo? A união deu certo?
Foi uma decisão muito acertada, porque é uma infraestrutura muito boa, de fábrica, de capacidade produtiva e de expansão. Quando assumimos a fábrica, fizemos alguns ajustes. A fábrica era um misto entre um local de eventos e uma fábrica de cerveja, com capacidade de produção em torno de 100 mil litros por mês. E optamos por torná-la uma fábrica sem eventos. Mudamos o perfil da unidade, colocando mais pasteurização e fermentadores, e elevamos a capacidade para 250 mil litros. O plano é chegar a 400 mil litros. Ela está geograficamente muito bem posicionada, a meia hora de São Paulo, ao lado de Campinas e a 40 minutos de Piracicaba.

Em 2023, vocês decidiram fechar a fábrica de Piracicaba. Como foi esse processo e o que motivou a CBCA a fazê-lo?
Foi uma decisão muito difícil, bem complexa. Tínhamos de um lado o que a fábrica representa para a Leuven e Piracicaba. Mas, ao mesmo tempo, a chegada da Startup trouxe um olhar diferente para dentro da CBCA. Então, olhamos e comparamos números. E percebemos que a fábrica de Piracicaba já não era suficiente para produzir a Leuven. Além disso, ela foi uma adaptação em um imóvel. Então, não era de fácil operação, trazia questões de complexidade. E sendo uma fábrica de 80 mil a 90 mil litros, a tornava ineficiente, era quase 3 vezes mais caro produzir lá do que nas outras. Então, veio a conjunção disso com o fato de que as outras unidades conseguiriam absorver essa capacidade. E isso tornou a decisão dura, emocionalmente complexa, mas óbvia. Foram 8 a 9 meses de estudo, mas foi uma decisão racional.

Qual é a sua avaliação sobre o ano de 2023 no mercado brasileiro de cervejas artesanais?
Em um setor com poucas marcas nacionais, as variáveis locais acabam influenciando na avaliação. Em Santa Catarina, um mercado maduro, mas que depende de datas específicas, como a Oktoberfest, vimos um sofrimento expressivo com o excesso de chuvas, com cancelamentos de eventos. Então, as cervejarias foram duramente impactadas. Em São Paulo, vejo uma cena mais aquecida, com 2023 sendo um ano de retorno, de mais movimentação e eventos, com a volta das ciganas à cena. De maneira geral, vejo cervejarias se reposicionando, seja com parcerias, redesenhando o portfólio ou mesmo redefinindo seus tamanhos. Mas todas com uma dificuldade em comum: o acesso ao capital de giro, pois o dinheiro está caro e escasso.

As mudanças climáticas podem ser um novo fator a afetar as cervejarias?
Nós, seres humanos, estabelecemos e buscamos padrões a partir do que se observou ao longo de milhares de anos, para tentar prever o que vai ser no futuro. Só que não combinamos esse jogo com a natureza, que é extremamente volátil. Então, temos que calibrar um pouco as nossas expectativas. Não acho que isso seja uma complexidade para gerirmos, é parte do jogo, temos de lidar com isso. Precisamos ter uma estratégia de diversificação de canais. Não só depender de eventos, pois se o ano é chuvoso, você perde. Se você depende dos supermercados e pega um ano que não chove nada e está todo mundo na praia, você perde. Você tem que estar no digital, no offline, no evento.  Tem que estar em tudo.

Como você disse, 2023 não foi um ano de grandes movimentos para a CBCA. Isso muda para 2024? Quais são os planos da CBCA?
É um ano ainda de crescimento orgânico. O nosso plano é chegar a R$ 250 milhões de faturamento em 5 anos, multiplicando o que temos hoje em 3,5 vezes. Para isso, precisamos crescer 20% ao ano, em média, além de uma aquisição que traga o faturamento adicional de R$ 30 milhões a R$ 40 milhões, e que seja passível de expansão. Não vejo essa aquisição acontecendo em 2024, as prioridades são outras. Pretendemos lançar em março uma rodada de captação pública, algo que fizemos em 2017, 2018 e 2019 com a Leuven. Vamos fazer por meio de uma plataforma de equity crowdfunding. Esse é o grande movimento que devemos fazer em 2024, captando recursos para essa expansão orgânica que precisamos.

Em sua opinião, quais são as perspectivas para o mercado cervejeiro em 2024?
Acho que vai haver uma retomada, uma reaceleração do mercado, ainda muito focada no on-trade, em bares especializados. Não acho que será um ano em que as marcas vão ganhar visibilidade no off-trade, onde as marcas das grandes cervejarias vão dominar e abocanhar o crescimento que o mercado craft tem, assim como acontece hoje. Vejo um retorno já com um pouco mais de relevância do mercado das ciganas, assim como da procura pelo conhecimento cervejeiro, com as pessoas buscando saber mais sobre cerveja. Em termos de perfil de consumo, vejo uma migração, com um retorno às bases, com o pessoal voltando para Lagers e produtos de entrada. O high-end está presente, com os seus 3%, 4% de mercado de craft. Mas a grande base se volta para os produtos de entrada ou migrando das premium para as crafts de entrada. Vejo com otimismo, com um crescimento de 25% do mercado de artesanais.

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