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Balcão da Fabiana: Concursos cervejeiros – São ou não são válidos para o mercado?

No fim de outubro, fui juíza e mestre de cerimônias da festa de premiação do Brasil Beer Cup, realizado em Florianópolis. Com ele, completei a lista de quatro concursos para os quais fui convidada a participar como juíza somente em 2022: World Beer Cup, Brasil Beer Awards, South Beer Cup e Brasil Beer Cup. E estou me referindo apenas aos concursos dos quais participei. Se formos contabilizar quantas outras competições foram realizadas este ano, no Brasil e em países das Américas, Europa e Ásia, seguramente chegaremos a mais de duas dezenas delas.

Fico me perguntando se, para as cervejarias, é ou não produtivo participar de inúmeros concursos no mesmo ano. Afinal, não é barato enviar as amostras e a logística para o transporte das cervejas não é das mais fáceis.

O que motiva, além da possível premiação, uma cervejaria a participar deste ou daquele concurso?

Quais critérios têm feito as cervejarias optarem por concorrer em uma competição em detrimento de outra?

São perguntas que venho me fazendo e que muitas vezes chegam até a mim por parte de muitas cervejarias. Não tem sido incomum o relato de cervejeiros que não querem mais participar das competições. E os principais motivos alegados por eles são:

  1. Juízes pouco qualificados para avaliar e julgar;
  2. Juízes brasileiros são despreparados em relação aos estrangeiros (sim, ouvi isso e mais de uma vez);
  3. Medalhas não servem para nada;
  4. Cervejarias premiadas fazem lotes especiais de cervejas que nunca chegarão ao mercado, apenas para ganhar medalhas;
  5. “ Minha cerveja que mais vende não ganhou nenhuma medalha em tal concurso. Isso não pode ser normal” – já ouvi essa alegação inúmeras vezes vindas de diferentes fontes;
  6. Concursos no exterior são mais sérios do que os realizados no Brasil.

Curiosamente, nenhuma cervejaria reclama da falta de feedback sobre sua cerveja. Mas se o feedback é negativo, aí sim o cervejeiro reclama. Ou seja, a análise só é válida se favorece a cerveja? Fichas que apontem problemas não devem ser levadas a sério?

Estaríamos diante então de um comércio de medalhas?

Se a cervejaria ganha medalha em algum concurso, a competição é séria. Se não ganha, a competição não tem o nível que a cervejaria merece. Ao mesmo tempo, se a competição confere muitas medalhas, é taxada de “pagou, ganhou”.

Estamos diante de um impasse, isso é fato. Não fosse só o número elevado de concursos, alguns outros pontos merecem nossa reflexão:

O primeiro deles é que estamos testemunhando a extensão das polarizações provocadas por ideologias e posições políticas para os concursos. Já existem disputas entre um concurso e outro sobre quem tem direito a usar nome que batiza o certame, sobre estilos próprios, sobre quem tem postura ética para coordenar o certame, sobre quem tem maior número de inscrições e até para quem tem o melhor time de juízes (o que é irônico, porque vários juízes participam de todos).

Em minha opinião, esse juízo de valor – melhor e pior – entre profissionais cria uma divisão por castas pouquíssimo saudável. Não é interessante para qualquer mercado criar inimizades e contendas entre os vários agentes que nele atuam. Quem ganha com isso?

Outro ponto que me chama atenção é a discussão sobre o pagamento de salários a juízes de concursos cervejeiros. Devo dizer que, mesmo sofrendo no bolso muitos gastos com os quais arcamos ao aceitar ser juiz em uma competição, sou contra essa ideia. Não acho que a autonomia de um juiz possa ser mantida quando se estabelece uma relação de patrão/empregado. Sim, porque ao se pagar salário a um avaliador, fica estabelecida essa relação. Imaginem patrocinadores exigindo medalhas das organizações dos concursos sob alegação de que “pagam o salário do juiz”? Onde entra dinheiro, pagamento, abre-se porta para corrupção. Não se iludam que isso não acontece.

Não tenho muitas respostas para as questões que levantei neste artigo. Também não consigo prever quais concursos vão se consolidar e quais tendem a desaparecer. O que me parece é que estamos chegando a um ponto de saturação do mercado com tantas competições, o que pode levar a descredibilização das premiações alcançadas.

Mais uma vez estou eu, aqui, lançando celeumas. Mas o papel do jornalista é este, não é? Provocar reflexões. Fica aqui o meu convite para pensarmos juntos em mais essa questão do mercado cervejeiro.


Fabiana Arreguy é jornalista e beer sommelière formada em 2010, pela primeira turma Doemens no Brasil, através do Senac SP. Produz e apresenta, desde 2009, a coluna de rádio Pão e Cerveja, sendo editora de site com o mesmo nome e autora de livros. É curadora de conteúdo, consultora de cervejas especiais, proprietária da loja De Birra Armazém Cervejeiro, além de professora do Science of Beer Institute e do Senac MG, assim como juíza dos principais concursos cervejeiros brasileiros e internacionais.

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