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Guia na Copa: Entenda polêmica sobre show de Ludmilla em evento da Bud

Ida da cantora ao país dividiu opiniões pelo histórico de desrespeito aos direitos humanos pelo Catar

A Copa do Mundo já entrou nas suas fases decisivas no Catar, aumentando o interesse pelos jogos, mas a competição tem movimentado o globo bem antes de a bola rolar, mostrando que o seu impacto é muito maior do que o esportivo. Tanto é que a cantora Ludmilla, uma mulher preta, bissexual e casada com outra mulher, mostrou que pode causar tão ou mais alvoroço na sociedade quanto o espetáculo dos craques em campo.

Se artistas como Shakira e Dua Lipa anunciaram a recusa em participar da cerimônia de abertura da competição, supostamente em função do histórico de desrespeito aos direitos humanos pelo Catar, Ludmilla aceitou ir até o país para uma apresentação, atendendo ao convite da Budweiser, marca patrocinadora da Copa, e exibiu satisfação pela oportunidade. “Só vai dar o Brasil. A nossa seleção brasileira em campo e a Rainha da Favela com Budweiser no palco. Tô muito feliz com o convite!”, escreveu, em seu perfil nas redes sociais.

A apresentação provocou críticas a Ludmilla, pela presença em um país onde a homossexualidade é tratada como crime e onde vigora um sistema de tutela da mulher pelo homem, mas também a colocou em uma posição de destaque em um esporte majoritariamente masculino.

Leia também – Entrevista: “A Copa envolve muito mais do que acontece no país-sede”

Com essas contradições, a participação da cantora em um evento deste porte também é vista como uma “vitória”, sobretudo porque a além de sua cor e de sua origem, Ludmilla ganhou projeção no segmento artístico com ritmos musicais que não são universais, como o pagode e o funk.

“Nesse sentido, é uma vitória, embora saibamos que o Catar é um país que discrimina pessoas que têm a orientação sexual da Ludmilla. Mas, infelizmente, pessoas negras têm pouca possibilidade de negar convites como esses. Porque se elas negam, vão ser punidas por isso durante muito tempo”, avalia Marivânia Conceição Araújo, doutora em Ciências Sociais pela Unesp, professora associada da Universidade Estadual de Maringá e coordenadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares Afro-Brasileiros.

É uma vitória que Ludmilla tenha sido convidada e eu compreendo perfeitamente, porque infelizmente o racismo impede que pessoas negras tenham a possibilidade de escolher suas áreas de atuação e de mostrar o seu trabalho

Marivânia Conceição Araújo, doutora em Ciências Sociais pela Unesp

Para a especialista, as restrições às mulheres, à liberdade de expressão e às liberdades individuais no Catar impedem que a presença de Ludmilla cause qualquer impacto relevante dentro do país. “Acho que a presença da Ludmilla vai ser mais importante provavelmente fora do Catar. Repercussão da apresentação dela, da excelência do trabalho, isso vai ser mais importante para ela como um artista no Brasil e também em outros países do mundo”, diz.

Por outro, a especialista avalia que a Copa do Mundo irá deixar algumas marcas positivas na população do Catar, embora não acredite que servirá como catalisadora de mudanças profundas na sociedade.

“Trata-se de uma sociedade tradicional-religiosa e com uma visão do mundo bastante conservadora e fundamentalista. Sendo assim, é difícil que todo esse conjunto de características se modifique por conta de um evento que acontece, embora seja um evento mundial, e muito grande, durante um mês”, explica. “Depois desse mês [de duração do evento], a realidade, a vivência vai permanecer de modo tradicional, como sempre foram. Essas mudanças podem acontecer de modo muito lento e provavelmente uma mudança interna, dentro da própria população, dentro da própria sociedade que vivencia todas essas limitações dos direitos humanos no Catar”, finaliza.

No palco e no centro do debate
A convite da Budweiser, Ludmilla se apresentou na última quinta-feira (1º), no “The Bud World Club”, um espaço dedicado a receber torcedores em Doha. Antes de viajar, por meio de suas redes sociais, ela declarou que sua ida ao país possibilitaria ações para a causa LGBTQIAP+.

“Desde que recebi o convite, fiquei pensando em como poderia contribuir com as causas LGBTQIA+ além da minha existência, resistência e tudo que represento. Para mim, não faria sentido não devolver algo para minha comunidade, já que aqui, o Brasil, é o país que mais mata pessoas LGBTQIA+ no mundo”, diz.

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Ludmilla relatou, ainda, que terá o apoio da Budweiser nessas iniciativas. “Tive a ideia e chamei a Budweiser, (vamos) começar um movimento de apoio a instituições que apoiam pessoas da comunidade, seja com iniciativas criativas, de acolhimento ou recursos básicos. Iremos escolher 5 instituições para apoiar durante todo o ano de 2023”, completa a cantora.

1ª Copa no Oriente Médio
Neste ano, o Catar se tornou o primeiro país do Oriente Médio a sediar a competição global. Mas não sem polêmicas e críticas. No mês passado, a Human Rights Watch, organização internacional de direitos humanos, publicou relatório denunciando que a Copa seria disputada após de graves abusos trabalhistas de pessoas imigrantes e dos direitos humanos no país.

“A Federação Internacional de Futebol (Fifa) concedeu os jogos ao Catar em 2010, sem realizar a devida diligência de direitos humanos e sem estabelecer condições sobre proteções para trabalhadores imigrantes que seriam necessários para construir a infraestrutura massiva. A Fifa também não avaliou as preocupações com os direitos humanos de jornalistas, ou a discriminação sistêmica que mulheres, pessoas LGBT e outros enfrentam no Catar’”, destaca a publicação.

De acordo com a Human Rights Watch, apesar das repetidas advertências sobre as condições de trabalho nos estádios, “a Fifa fracassou em impor rígidas condições para proteger os trabalhadores e tornou-se uma facilitadora complacente dos abusos generalizados sofridos pelos trabalhadores, incluindo a cobrança de taxas ilegais de recrutamento, não pagamento de salários, ferimentos e mortes”, diz.

Em maio, a Human Rights Watch e outras organizações de direitos humanos, sindicatos e grupos de torcedores pressionaram as autoridades da Fifa e do Catar em uma Carta Aberta Conjunta e uma campanha para fornecer uma reparação para os abusos sofridos pelos trabalhadores, incluindo compensação financeira por não pagamento de salário ou lesões, e às famílias dos falecidos.

Direitos das mulheres, LGBTQIA+ e de expressão
A Human Rights Watch também publicou um relatório com as leis, regulamentos e práticas que impõem regras discriminatórias de tutela masculina no país anfitrião da Copa. São adotadas práticas que negam às mulheres o direito de tomar decisões importantes sobre suas vidas.

“As mulheres no Catar devem obter permissão de seus guardiões do sexo masculino (membros da família do sexo masculino) para se casar, estudar no exterior com bolsas do governo, trabalhar em muitos empregos do governo, viajar para o exterior até certas idades e receber certos cuidados de saúde reprodutiva”, conta.

Além disso, os direitos dos LGBTQIA+ também não são respeitados naquele país, como pontua a organização, lembrando que o código penal do Catar pune relações sexuais consensuais entre homens maiores de 16 anos. A liberdade de expressão e de imprensa também não são respeitadas no Catar, como ressalta a Human Rights Watch. “O código penal do Catar criminaliza criticar o [monarca e chefe de Estado] emir, insultar a bandeira do Catar, difamar a religião, incluindo blasfêmia, e incitar a ‘derrubada do regime’”, diz.

Dentro de campo
Todas as polêmicas envolvendo a Copa do Mundo no Catar também se refletiram dentro de campo, com protestos e manifestações de seleções. Às vésperas do início dos jogos, a Fifa anunciou a proibição da utilização das braçadeiras “One Love” que seriam usadas como protesto por seleções europeias. O símbolo One Love traz uma mistura de cores que representam as diferentes raças, origens, identidades de gênero e orientações sexuais. Segundo a Fifa, a utilização do item provocaria aplicação de punições esportivas aos atletas.

Diante disso, os alemães, no jogo de estreia, contra o Japão, fizeram um protesto contra o silenciamento e taparam suas bocas com as mãos. Contra o racismo, os jogadores de Inglaterra e País de Gales, por sua vez, se ajoelharam juntos em protesto no meio de campo e antes do apito inicial. Os atletas ingleses já haviam se ajoelhado em protesto também antes dos jogos contra Irã e Estados Unidos.

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