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Com guerra na Ucrânia, alta dos custos de produção desafia indústria cervejeira

guerra cerveja
Ucrânia e Rússia têm grande importância na produção mundial de trigo, cevada e malte

A invasão da Ucrânia pela Rússia e a consequente guerra entre os dois países, iniciada em 24 de fevereiro, vai aumentar os custos de produção da cerveja. O diagnóstico foi apresentado por diversos especialistas ouvidos pela reportagem do Guia e tem relação direta com a importância das duas nações no comércio internacional e na produção de itens básicos para a fabricação da bebida, como cevada e malte.

Há, ainda, a preocupação com o risco de escassez desses insumos fundamentais para a cerveja, seja pela redução da produção por países envolvidos na guerra ou mesmo pelas decisões dos governos locais, como o da Ucrânia, que na última semana suspendeu as exportações de trigo, cevada e centeio. Além disso, no Brasil, a recente alta dos preços dos combustíveis já sinaliza outros efeitos, com a distribuição se tornando mais cara.

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Assim, a avaliação é de que o impacto sobre os custos de produção da cerveja será relevante, ainda que neste momento não seja possível prever em qual grau, o que dependerá da extensão da guerra na Ucrânia, com os resultados sobre a sua produção agrícola, assim como das sanções que as principais nações ocidentais estão impondo à Rússia.

Afinal, os dois países envolvidos nos conflitos têm grande importância na produção mundial de trigo, cevada e malte. “Podemos esperar maiores pressões de custos para os principais insumos utilizados na produção de cerveja, uma vez que a Rússia é o principal exportador de trigo no mundo (responsável por 19% das exportações totais), o que acaba impactando no preço do malte, além de a Ucrânia ser um dos 5 maiores produtores de cevada do mundo”, afirma Pedro Fonseca, analista da XP Investimentos.

Pesquisador da Embrapa Trigo, Aloisio Alcantara Vilarinho destaca que nações antes compradoras de cevada e malte da Rússia, especialmente aqueles que tenham adotado sanções econômicas em relação ao país, precisarão buscar alternativas e fornecedores. Assim, os preços desses cereais tendem a crescer diante da menor oferta e da maior concorrência.

“Devido à guerra, e principalmente pelos embargos econômicos impostos pelo Ocidente, é provável que muitos países que importavam cevada e malte da Rússia não consigam mais fazê-lo. Isso concentrará as buscas por cevada e malte em outros produtores não afetados diretamente pela guerra ou pelos embargos”, diz.

O cenário não é muito diferente para o Brasil, embora a maior parte da cevada e do malte importados pelo país venham dos vizinhos Argentina e Uruguai. Em 2021, porém, foram US$ 64,03 milhões comprados em malte da Rússia, terceira nação a mais exportar o produto para o Brasil, com uma participação de 9,2% nas vendas. Na visão de Vilarinho, assim, o país também sentirá os efeitos do embargo à economia russa.

“Ainda que a Rússia não seja o principal fornecedor de cevada e malte para o Brasil, é quase certo que o país será mesmo assim impactado pela guerra, pois a procura pelos outros fornecedores aumentará. E ainda tem todos os reflexos na economia mundial advindos das sanções impostas à Rússia, como por exemplo aumento no preço do petróleo”, afirma.

O pesquisador da Embrapa Trigo também lembra que como o Brasil não é autossuficiente na produção de malte e cevada, a cadeia produtiva da cerveja acaba sendo afetada por eventos externos, ainda mais um com a magnitude da guerra entre duas nações com relevância na produção de grãos.

“O Brasil produz aproximadamente metade da cevada que precisa para abastecer as indústrias de malte instaladas no País. Além disso, o malte produzido por essas maltarias é suficiente para atender pouco mais da metade da demanda das indústrias de cervejas instaladas no país. Sendo assim, dependemos do mercado externo para fornecer tanto grãos de cevada quanto malte de cevada. Com aumento nos preços desses produtos no mercado externo, é certo que sofreremos um grande impacto nos setores ligados a essa cadeia produtiva aqui no Brasil”, argumenta.

Lucas Novello, especialista em agro da Zahl Investimentos, também alerta como a extensão do conflito causa impacto na redução das safras da Rússia e da Ucrânia, um país central para o fornecimento de grãos para todo o mundo, com seus solos ricos e férteis, mas agora mais preocupado em defender em seu território do que em produzir algo. “É natural que no meio de uma guerra não se tenha muito foco na produção. E isso causa um impacto direto, com quebra de safra. E aí há a alta do preço pela diminuição da oferta”, diz.

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Com a Ucrânia sendo uma das cinco maiores produtoras de cevada do mundo, especialistas avaliam que pode haver escassez do produto no mercado mundial. E, principalmente, reconhecem que certamente ele ficará mais caro como consequência da invasão do país pela Rússia.

“Já vemos os futuros dessa commodity em forte alta, acima de patamares históricos. Ainda não está claro quais serão os impactos finais da guerra na produção e exportação do cereal, portanto, além de esperar preços maiores, não podemos descartar a possibilidade de falta de insumos e desabastecimento global da cevada”, argumenta o profissional da XP.  

E o especialista em agro da Zahl Investimentos, também avalia que há risco real de falta de grãos no mercado, especialmente daqueles em que há alta dependência da produção ucraniana e russa. “Hoje não há um excesso de produção. Quando há uma queda na produção, não há uma queda igual no consumo. É possível que se tenha problema de abastecimento”, avalia Novello.

Como em um efeito dominó, Carlo Enrico Bressiani, diretor da Escola Superior de Cerveja e Malte (ESCM), prevê que a alta dos preços não se resumirá apenas a aquelas commodities que têm Rússia e Ucrânia como grandes produtores. “Provavelmente vai ter algum impacto também nos custos, principalmente do lúpulo europeu. E aí vai se espalhando para o resto do mundo”, diz.

Além disso, os impactos da guerra não devem se resumir a aumentos dos preços de ingredientes da cerveja, mas irão encarecer outras despesas das companhias. “Adicionalmente, a crise entre Rússia e Ucrânia e seus impactos em preços de commodities e inflação irão impactar os custos das cervejarias em outras frentes, como por exemplo no custo do alumínio, do vidro e do frete”, avalia o analista da XP.

O impacto do conflito sobre o preço do petróleo, inclusive, já trouxe efeitos antes mesmo do seu fim, com a Petrobras anunciando alta de 25% no preço do diesel e 19% da gasolina na última semana. Algo, claro, que o setor cervejeiro não conseguirá passar alheio. “Isso causa uma alta do custo de distribuição, o que deixa o produto mais caro”, comenta o especialista da Zahl Investimentos.

Como as cervejarias vão se comportar
O efeito óbvio da alta dos custos para produção da cerveja poderia ser o repasse ao consumidor. O analista da XP, pondera que o cenário adverso da economia deve levar as grandes cervejarias brasileiras, como a Ambev e o Grupo Heineken, a adotarem uma estratégia que já se viu no ano passado: o reforço da aposta no portfólio premium.

No Brasil, entendemos que o ambiente macroeconômico mais deteriorado, com inflação maior, tornará mais difícil o processo de repasse de preços por parte das cervejarias. Na nossa opinião, as cervejarias irão buscar formas alternativas para atenuar as pressões de margem causada pelo aumento de custos, como, por exemplo, no processo de mudança de mix de vendas para um share maior de cervejas de maior valor agregado

Pedro Fonseca, analista da XP Investimentos

Por outro lado, na avaliação de Bressiani, o consumidor, já afetado pela perda do poder de compra, poderá rever as cervejas que irá comprar, caso ocorra alta dos preços, algo que pode afetar, principalmente, o mercado de artesanais, com rótulos que possuem valor agregado maior. Além disso, prevê a possibilidade de alterações nos locais de consumo, como ocorreu em alguns períodos mais críticos da pandemia do coronavírus.

“A gente entende que isso possa significar, em algum momento, uma redução de consumo de produtos com maior valor agregado ou em locais onde eles custam um pouco mais caro”, afirma. “Vai ter mudança de ocasião de consumo, então pode ter um ciclo parecido com o da final do ano passado, na pandemia”, acrescenta.

Em outro fator de preocupação para as marcas artesanais, o especialista da Zahl Investimentos aponta que elas devem sofrer mais com os impactos da guerra, pela dificuldade de se protegerem das oscilações sobre os custos de produção da cerveja. “Elas não têm capacidade de estocagem e fluxo de caixa, então ficam muito mais expostos a uma possível escassez de produtos”, argumenta.

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