fbpx
breaking news New

Repetição de casos de racismo evidencia falta de ações eficientes no setor

Especialistas avaliam que racismo estrutural faz desafios persistirem dentro do setor cervejeiro

Apesar das iniciativas em diversas frentes, as questões estruturais que perpetuam o racismo ainda são amplamente presentes no Brasil. Diariamente, diversos casos de racismo evidenciam consideráveis desafios para se alcançar a equidade, com o setor cervejeiro não fugindo a essa realidade.

Recentemente, o segmento, que nos últimos anos enfrentou casos alarmantes, foi novamente marcado pela violência racial durante a edição de 2023 da Oktoberfest Blumenau. O incidente ocorreu na semana seguinte a uma operação policial motivada por outra ocorrência de racismo, essa da edição anterior da festividade, em 2022.

Leia também – Alagoinhas se firma como polo cervejeiro e faz festival para promover cultura e turismo

Esses casos no meio cervejeiro não apenas refletem a presença do racismo no país, mas também destacam a escassez de mudanças e a necessidade de maior eficiência nas ações de combate à discriminação em um país de trajetória marcada pela discriminação, avaliaram especialistas ouvidos pela reportagem do Guia.

 “Sempre ignorou-se a triste história da escravidão no Brasil e como isso influenciou a sociedade e o que temos como resultado é uma menor fatia da população detendo o poder e no meio cervejeiro não é diferente”, analisa a sommelière Evy Lins.

Cinara Gomes, sócia-fundadora da Cervejaria Serafina, acredita que as ações realizadas nos últimos anos pouco ajudaram a mudar o que ela avalia ser a persistência de uma mentalidade racista. “Pequenas ações e pontuais estão sendo feitas mais para cumprir um protocolo politicamente correto, que é ter a presença de negros ali como forma de dizer: nosso evento é diverso, plural, inclusivo, para não escancarar um abismo estruturante que é a perpetuação de quem manda e de quem tem o poder aquisitivo e de quem de fato quer manter os privilégios que sempre teve”, conta.

O sócio-fundador da Cervejaria Implicantes, Diego Dias, também analisa que o racismo  sempre fez parte da sociedade. Nos casos vistos na Oktoberfest, ele sugere que o problema não está na festividade em si, mas avalia que uma visão equivocada sobre culturas pode ser um componente importante da prática de um racismo recreativo nas convivências interpessoais dentro de um dos mais famosos eventos do setor cervejeiro.

“As repetidas ocorrências de racismo talvez possam ser explicadas por questões específicas nossas. Por ser um festival que remete à cultura alemã (europeia), acaba fazendo com que muitos racistas se sintam menos constrangidos para se manifestarem, por acreditarem, de forma equivocada, que aquele seria um ambiente próprio”, diz o profissional da cervejaria gaúcha.

Publicidade

Mas e as mudanças?
Quanto às mudanças, o sócio da Implicantes argumenta que embora algo venha sendo feito, a discussão ocorre apenas após os eventos ou no mês de novembro, próximo ao Dia da Consciência Negra. “Passado um tempo, há um esquecimento por parte do setor, pois é uma questão estrutural”, afirma.

Para a sommelière Sara Araújo, o mercado cervejeiro está mais preocupado em não ser rotulado como racista do que em combater efetivamente o racismo. Ela ressalta a falta de representatividade negra nos eventos e a apropriação do discurso antirracista, sem mudanças substanciais na prática. “É para dizer, ‘olha nós estamos nos letrando, estamos pensando nisso, temos um comitê de diversidade aqui dentro da empresa’. Mas, na prática mesmo, a mudança não ocorre”, completa.

Falta de ações efetivas?
Se o racismo ainda é um problema profundo e estrutural que vai além do setor cervejeiro, Dias destaca que a mudança também necessita ser profunda, cotidiana e com verdadeira responsabilização dos envolvidos nos atos racistas. “Não basta um simples vídeo de desculpas, com cara de triste, no estilo ‘quem me conhece sabe(…) Tenho até amigos que (….)’. É necessária uma verdadeira reflexão por parte do setor e de toda a sociedade para que algum dia essas cenas lamentáveis e violentas (ainda que não fisicamente) fiquem de fato no passado”, completa.

Evy Lins lamenta a elitização persistente no meio cervejeiro e enfatiza a importância de dar voz e poder às pessoas pretas no setor. “São necessárias atitudes eficazes contra os autores de atos racistas e a favor da igualdade para que o setor evolua”, acrescenta.

Para Cinara, é fundamental reestruturar a própria base dos eventos e adotar ações efetivas contra atos racistas para promover a evolução do setor. “Se tivesse sido amplamente combatido e punido em 2020, 2021, 2022, além da adoção de uma educação antirracista sistêmica, não estaríamos falando disso”, completa a sócia da Cervejaria Serafina.

No entanto, apesar dos avanços legislativos, como a equiparação do crime de injúria racial ao de racismo pela Lei 14.532/2023, Sara destaca a falta de punição efetiva nos casos de racismo e a necessidade de uma educação sobre o tema nos eventos cervejeiros.  “Entende-se que é imprescritível e inafiançável, logo, a gente já tem esse grande avanço legislativo, contudo, as práticas ainda continuam no mesmo status de antes”, diz.

Afinal, como destaca Cinara, a representatividade negra não deve ser apenas simbólica, mas sim uma busca por mudanças reais e inclusivas. “Ainda estamos lutando pelo direito de existir em paz e com muita dificuldade financeira em nossos negócios. Quer diversidade no meio? Colaborem com nossos negócios de forma sistêmica para conseguirmos chegar mais fortes”, finaliza.

1 Comment

  • Andreia Gonçalves Reply

    21 de novembro de 2023 at 08:59

    Força, Fabi! A relevância do trabalho de vocês é enorme. Sua voz há de ecoar.

Deixe um comentário

Login

Welcome! Login in to your account

Remember me Lost your password?

Lost Password