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Artigo: Copa do Mundo e cervejas

Novos projetos cervejeiros vêm surgindo em França e Argentina, países finalistas da Copa do Mundo

*Por Gui Rossi

Essa é minha terceira Copa do Mundo enquanto sommelier e dono de bar. E em todas essas edições sempre gostei de trabalhar promoções e cervejas temáticas de acordo com os jogos das seleções principais. Ou pelo menos seleções de países com tradição cervejeira.

A ideia é bem simples: jogo da Inglaterra, ações com cervejas inglesas; jogo da Alemanha, ações com cervejas alemãs. E quando tem confronto direto fica ainda mais divertido.

E nessa toada sempre foi natural pensar em paralelos entre os principais estilos representativos das escolas clássicas e a maneira de cada seleção jogar, assim como com as características de seus principais jogadores.

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Afinal, é possível encontrar semelhanças entre meio-campistas habilidosos, como De Bruyne e Hazard, com um jogo versátil e muitas vezes complexo taticamente, e uma Blonde Ale ou Quadruppel da escola belga. E por falar nos Diabos Vermelhos, nada melhor que uma Duvel, clássico cervejeiro representante do estilo Strong Golden Ale: a aparência passa a impressão de ser fácil de beber, porém seu alto teor alcoólico muito bem escondido engana, a ponto até de eliminar a seleção canarinha em uma quarta de final como em 2018.

Podemos pensar na relação entre a operária seleção inglesa, de jogo simples e futebol de resultados, com as Porters originárias dos estivadores, diretas e retas, ou como diriam os bretões, “very straight forward”. É claro que sempre existem os medalhões como Harry Kane, o centroavante parrudo como uma Imperial Stout ou uma Barley Wine, e o garoto Phil Foden, destaque nessa copa com sua velocidade e inteligência, bem ao estilo das Bitters tradicionais, fáceis de beber em qualquer ocasião com aquela base de maltes “cookie like”, seus lúpulos florais e terrosos e baixo teor alcoólico. É pau para toda obra.

Como não falar da Alemanha e seu jeitão alemão de jogar, de obediência aos protocolos e muita competência na execução, e com capacidade de renovar seu quadro de jogadores com jovens prontos para fazer o que deles se espera? Em uma frase? Lei da Pureza. Tudo deve funcionar como uma máquina e vivenciamos isso com dores profundas em 2014.

É clássico como os estilos que representam essa escola tradicional e imortal de Pilsens, Helles e Lagers em geral. Assim como Franz Beckenbauer, Lothar Matthäus, Jürgen Klinsmann e Thomas Müller. Imortais. E não é tudo igual como alguns podem pensar: tem as Kolsh, fermentadas em temperaturas mais altas entregando notas frutadas sutis que lembram um Risling; as Weizen, feitas com uma proporção dominante de trigo e de alta fermentação; e as Gose, ácidas e salgadas. Mas que ninguém se engane pois até para isso tem regras rígidas e procedimentos seculares.

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Mas nenhuma dessas esquadras chegou à final deste ano. Argentina e França vão decidir o Mundial neste domingo com seleções equilibradas, repletas de jogadores jovens e algumas figurinhas carimbadas mais experientes. São duas nações de pouca tradição no ramo e a preferência nacional de ambas no que diz respeito à cerveja talvez ainda seja a boa e velha Light Lager como uma Quilmes de litrão ou uma 1664, para matar a sede de um De Paul, que corre 10km por jogo, ou um Rabiot. E ainda tem o vinho, competindo nesse meio de campo embolado, com o status de grande produto nacional de exportação mundial.

Entretanto, novos projetos vêm surgindo nessas duas grandes nações. Na França, causa surpresa a quantidade de bares, brewpubs e cervejarias voltadas para o segmento artesanal, muitas inspiradas na vizinha escola belga e outras tantas nas americanas, além de muita cerveja pautada em acidez e frescor, talvez na esteira da expansão dos vinhos naturebas, excelentes lá por sinal. Mas ainda a única comparação possível é de Mbappé com um bom vinho francês: o rapaz só tem 23 anos e vai envelhecer bem demais.

Na Argentina, o mercado vem se desenvolvendo de forma muito diferente, com projetos pautados na maturação em barris e complexidade de microfaunas locais, do jeitinho que a gente gosta. Juguetes Perdidos, Klooster e Astor Birra exemplificam bem a pegada e entregam magia, assim como Lionel Messi, o grande maestro dessa orquestra argentina, que tem a maior chance de conquista do tri dos últimos anos en tu último tango.

Já para o Brasil faltou identidade. Faltou essa acidez gostosa das Catharina Sours que refrescam e entregam sabores nossos. Faltou levedura selvagem da Mantiqueira com aquela complexidade que vemos nas cervejas da Zalaz. Faltou o trabalho de conhecer a própria microfauna de suas barricas de madeiras nativas que a Cozalinda faz de maneira primorosa.

Hoje a cena cervejeira brasileira caminha para as cervejas de terroir, com identidade própria, respeito aos ingredientes locais, leveduras autóctones e uso de frutos e madeiras nativas. Vale citar aqui o projeto incrível da Manipueira, de caráter antropológico e que resgata tradições dos povos originários Se ainda não ouviu falar vale a pena pesquisar).

Faltou para a seleção canarinha o equilíbrio entre os craques da Premier League e outros campeonatos europeus como Vini Jr., Casimiro, Militão e Neymar, e os “ingredientes locais”, como Gabigols e Scarpas, que mereciam uma chance ou uma sequência, ou Pedro e Everton Ribeiro, convocados mas subaproveitados. Aí daria samba. Enfim, faltou Brasil.

Mas como não somos técnicos de futebol (ou somos todos técnicos como já disse alguém), o que importa é escolher quais as próximas garrafas de brasilidades que iremos abrir e compartilhar com os amigos durante os próximos 4 anos. Saúde que em 2026 o hexa vem!

*Gui Rossi é sommelier de cervejas, mestre em estilos, atual vencedor do Campeonato Brasileiro de Sommelier de Cervejas e proprietário do The Beer Market.

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