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Guia na Copa: Negro molda cultura do futebol desde Leônidas e chega à cerveja

Artilheiro da Copa do Mundo de 1938, Leônidas marcou jeito brasileiro de jogar futebol (Créditos: Memória CBF)

A formação cultural do Brasil, com as características que compõem os traços da sociedade, passa, necessariamente, pela trajetória e participação do negro. Essa presença é ainda mais preponderante no esporte que expressa a cultura nacional, o futebol, referência associada ao país em solo estrangeiro, e no qual o negro é craque e referência, como Leônidas da Silva, Pelé e Ronaldinho Gaúcho, mas também vilanizado, como Barbosa, e excluído.

A exclusão data já da chegada do futebol ao país, como um esporte de elite, mas um cenário que se alteraria rapidamente em comparação a outros aspectos de manifestações culturais que deixam, até hoje, o negro marginalizado. Mas que não mudaria nos cargos de poder no esporte e de comando, com o país tendo poucos técnicos e dirigentes negros nos principais clubes.

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“A escravidão termina em 1888 e o futebol chega, oficialmente, ao Brasil em 1894. Seria pouco logico pensar que o negro se incluiria rapidamente.  Mas, pensando em outros aspectos da cultura, a inclusão até foi rápida. E isso tem muita relação com o profissionalismo, pois antes as pessoas pobres não teriam como se dedicar a ele”, avalia o doutor em Educação pela UFRGS Gustavo Bandeira e autor do livro “Uma história do torcer no presente”.

Com essa entrada do negro em campo, a sua participação no futebol brasileiro e a relação cultural que molda a sua associação à modalidade se dão a partir de alguns pilares, como a ampliação da gama de talentos a serem selecionados, o sucesso esportivo brasileiro, que tem os negros como protagonistas, e a lógica da representatividade. “Acredito que esse foi um dos primeiros espaços que os negros ocuparam com seus talentos, apesar de todo o preconceito existente”, avalia Diego Dias, sócio-proprietário da Implicantes, cervejaria que homenageia em seus rótulos personalidades históricas negras.

E se é verdade que o torcedor brasileiro teria de esperar até 1958 para comemorar o primeiro título mundial, foi 20 anos antes que o país viu o talento negro emergir para o mundo, com o “Diamante Negro”. Foi assim que ficou conhecido Leônidas da Silva, artilheiro da Copa do Mundo de 1938, com oito gols, e destaque máximo da seleção brasileira, terceira colocada na competição realizada na França.  

Também se consagrou como ídolo de São Paulo e Flamengo, levando multidões aos estádios. Nos paulistas, sua estreia é responsável pelo maior público da história do Pacaembu, com 70 mil pessoas, em 1942, para um clássico entre São Paulo e Corinthians. No Rio, é considerado figura fundamental para tornar o Flamengo o clube com mais torcedores no país.

Em todo o Brasil, acabou eternamente associado aos gols de bicicleta, embora historiadores do esporte apontem o chileno Ramón Unzaga Asla como inventor da jogada. Mas o que mais importa é que o seu poder de improvisação e agilidade, exibidas com o corpo solto no ar, nunca mais se dissociaram das características desejadas e associadas ao jogador brasileiro.

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 “Tivemos o entendimento que a maneira como Leônidas jogava era um jeito brasileiro de jogar futebol. Ao longo dos tempos, isso continuou bem representado por outros atletas, a sua maioria negros, com o último grande expoente sendo Ronaldinho Gaúcho, com os seus dribles e alegria”, diz Bandeira.

Não à toa, Leônidas virou produto. O Diamante Negro foi chocolate criado em 1939 e continua sendo comercializado até hoje com enorme sucesso. Mais recentemente, também estampou rótulo de cerveja, a Grande Artilheiro, uma German Pilsner, da Implicantes.

“A homenagem, mais que devida, ao Leônidas da Sílvia foi para lembrar a sua história e feitos, que são inúmeros. Foi ele quem difundiu a jogada conhecida como bicicleta, que sempre acabava em gol. Foi, ainda, o primeiro jogador a ser garoto-propaganda de marcas, entre outras conquistas. Mesmo assim, com todo seu talento e conquistas, sofreu racismo, pois, naquela época, o negro não podia tirar foto em formação com a equipe toda”, diz o sócio-fundador da Implicantes.

Depois de Leônidas…
Se Leônidas foi o primeiro craque e ídolo negro do futebol nacional, ajudando a construir o estereótipo do jogador brasileiro, a relação entre o esporte, uma sociedade onde o racismo está presente, seja de modo velado ou não, e o homem preto, teve, é claro, momentos em que o preconceito contra ele esteve escancarado, ainda que em meio às críticas esportivas.

Foi, assim, em 1950, com o goleiro Barbosa sendo o principal vilão da derrota para o Uruguai, com “uma condenação” que marcou toda a sua vida, com atos de crueldade, como impedi-lo de visitar a seleção brasileira na preparação para a Copa de 1994. “Algumas pessoas dizem que a culpa recaiu sobre ele por ser o goleiro, mas uma pessoa preta no Brasil, nunca deixa de ser uma pessoa preta. Não dá para separar isso. A trajetória do negro sempre passa por isso”, argumenta o doutor em educação pela UFRGS.

O título mundial que não veio para o Brasil de Barbosa, mas seria conquistado em 1958, no início do reinado de Pelé no futebol mundial.

Ao seu modo, Pelé colocou o homem preto no topo do mundo. Ele faz até os racistas reconhecerem que o melhor jogador do mundo é um homem negro. Com isso, Pelé ajuda a dar visibilidade e mostra que o homem preto pode ser o melhor de todos

Gustavo Bandeira, autor do livro “Uma história do torcer no presente”

Assim, a atmosfera que envolve o futebol brasileiro está, até internacionalmente, associada aos craques negros. E, de quatro em quatro anos, famílias se reúnem, em meio a churrascos regados a cerveja, para a comemoração inebriante da vitória ou a resiliência da derrota.

“No Brasil o futebol sempre foi reverenciado e entendido como nossa identidade cultural. A presença significativa de negros, deu ao futebol sua brasilidade, com penteados, gingado. Isso vai além do campo, com referência trazidas pelos ídolos até mesmo na forma de vestir, falar”, conclui o sócio-fundador da Implicantes.

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