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Entrevista: “Momento é propício para pedir menos impostos para artesanais”

Presidente da Abracerva avalia que Brasil tem "pior sistema tributário do mundo"

O peso dos impostos foi o principal desafio encarado pelas cervejarias artesanais no ano passado. De acordo com “O Ano de 2022 para as Cervejarias”, pesquisa inédita e exclusiva realizada pelo Guia da Cerveja, esse foi o maior problema enfrentado por 35,7% dos respondentes, um sinal claro de que a tributação sobre o segmento precisa mudar.

E a oportunidade pode estar surgindo em 2023, de acordo com a visão apresentada por Gilberto Tarantino, presidente da Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva), em entrevista ao Guia Talks, em que ele avalia os resultados do levantamento e relata como tem sido seu trabalho à frente da entidade.

Giba garante que a tributação é pauta prioritária da gestão da Abracerva e envolve várias frentes, com o intuito de conseguir a redução de impostos. Assim, a atuação passa por debates na Câmara Setorial da Cerveja, construção de propostas e articulações que vão da esfera municipal até a federal.

O trabalho, claro, tem o intuito de alterar o que ele define como “pior sistema tributário do mundo”. E a expectativa de mudança se dá, também, pelo desejo do governo federal em realizar uma reforma tributária logo no primeiro ano do atual mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na entrevista, o presidente da Abracerva também comenta sobre a perspectiva do mercado de artesanais no país e outras ações da associação, como a criação do evento Conexão Cerveja Brasil.

Leia também – 41% das cervejarias seguem com faturamento abaixo do nível pré-pandemia

Confira os principais trechos do Guia Talks com Gilberto Tarantino:

Qual é a importância da pesquisa “O Ano de 2022 para as Cervejarias” e de iniciativas desse tipo para o setor?
Estamos em 2023 e daqui a pouco 2024 também já está fazendo parte dos planos de todos nós. A inteligência de dados e as informações são muito importantes para o nosso segmento quando a cervejaria vai correr atrás de um patrocínio, quando a associação vai correr atrás de uma pauta de relacionamento governamental, quando vamos falar de impostos, do tamanho do segmento para a criação de empregos, em casos de mobilização. O dado é um argumento para a captação de recursos e até a sensibilização dos diversos órgãos e autarquias sobre o tamanho do nosso mercado. E precisamos de fontes seguras. Essa pesquisa é uma base para projetos e pleitos que estamos buscando constantemente.

A pesquisa indica que 46% das cervejarias brasileiras não tiveram lucro em 2022. Como você encara esse dado?
O Brasil, eu ouvi isso recentemente, tem o pior sistema tributário do mundo. Conversando com amigos que têm cervejarias nos Estados Unidos, quando falo que trabalhamos com lucro real, eles acham que é uma mentira, pois chegamos a pagar 56% de imposto. Quem quer trabalhar no Brasil de uma maneira formal e séria, enfrenta muitas complicações. Sabemos que as grandes cervejarias têm um percentual de impostos parecido, porém elas fabricam bilhões de litros por mês. A diferença é muito grande. Proporcionalmente, as cervejarias menores geram muito mais empregos do que as grandes. A partir de um certo volume, a produção vai ficando mais eficiente, além de toda a automação de equipamentos. Se essas cervejarias menores não forem muito bem-sucedidas, independentemente do tipo de tributação que elas escolheram, fatalmente elas vão fechar. Então, é extremamente preocupante termos esse dado de que a maioria das cervejarias trabalha no negativo.


Como as cervejarias podem atuar para melhor lidar com um cenário tão complicado?
Existem alguns aprendizados, como uma melhora na gestão, uma opção melhor pelo regime tributário, que sem dúvida é o Simples, no qual até 85% das cervejarias estão enquadradas. Temos que fazer um trabalho de conversa dentro dos estados, olhando para o ICMS e a Substituição Tributária. Alguns estados, como o Rio de Janeiro, já têm uma condição acordada com os parlamentares locais. Os estados do sul (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná) têm uma redução desse imposto. São Paulo, por exemplo, não tem nada, tem um ICMS cheio. Então, seria interessante discutir isso por meio de uma união, no caso, através da associação, que tem o olhar para os tributos como nossa prioridade número 1. É um trabalho meio invisível, que não recebe muita publicidade, não gera polêmica, mas é vital para a existência das cervejarias.

Como a Abracerva tem se envolvido nas discussões sobre tributação, incluindo a possibilidade de acontecer uma reforma? Quais são as principais demandas?
Isso é um assunto que está em discussão na Câmara Setorial da Cerveja, que está diretamente ligada ao Ministério da Agricultura. Nós criamos um grupo de trabalho para analisar esse assunto. Temos feito propostas frequentemente dentro desse grupo visando a reforma tributária. É bom existir um grupo de trabalho, porque o objetivo é discutir ideias e chegar a um consenso. Temos uma reunião semanal dentro desse grupo de trabalho, com a Abracerva tendo feito propostas bem claras. Nós apresentamos as propostas e esperamos a ação. Durante a reunião, pedimos um retorno dos participantes. A nossa proposta é, em relação ao IPI e ao Cofins, uma taxação diferenciada para as pequenas empresas, em comparação com as grandes cervejarias. Isso se deve à produção em si, ao volume e às dificuldades de fluxo de caixa das pequenas empresas. Estamos alinhando isso com outras associações.

E como tem se dado essa discussão?
Temos uma proposta que classifica por volume de produção: microcervejaria, pequena cervejaria, cervejarias médias e, depois, as grandes. Está em fase final de estudo. A reforma tributária é uma primeira etapa e deve ser concluída até junho ou julho. Segundo o entendimento do pessoal de Brasília, há dois projetos de lei que devem ser adotados pelo governo, que servirão de base para isso. Em uma segunda etapa, é importante para a associação a discussão sobre o imposto seletivo. Isso aumentará a tributação sobre bebidas e cigarros. Portanto, essa é uma segunda fase muito importante. Sabemos que dentro das bebidas alcoólicas, a cerveja tem um teor alcoólico variável, desde cervejas mais leves até cervejas com maior teor. Isso envolve uma discussão entre o segmento de bebidas alcoólicas. Nosso pleito é que se houver uma taxação, seja aplicada a menor taxa possível com base no teor alcoólico. Essa é outra luta.

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Pensando no âmbito estadual e municipal, há outras pautas tributárias importantes?
Estamos tentando também organizar pleitos por estado para os governos locais em relação ao ICMS e à Substituição Tributária. É importante que as cervejarias entendam por que é bom estar associado e compreendam o quanto geram de impostos, turismo, empregos e o potencial de crescimento de novas cervejarias em cada local. Na luta pelos impostos estaduais, queremos criar um procedimento e disseminá-lo pelos demais estados brasileiros, comprovando, através dos números, o crescimento do nosso segmento e, consequentemente, de empregos, renda e impostos, para que isso circule. Essa é uma luta que, até o momento, tem sido um tanto discreta, mas é importante sinalizar. Também temos uma luta frequente em nível municipal. Existem vários projetos de lei contra a cerveja, e em conjunto com outras associações, quando descobrimos, através do Diário Oficial do dia, por exemplo, precisamos conversar com os vereadores e mostrar o nosso mercado. Temos três grandes players, mas também temos 1.500 cervejarias que trabalham localmente. São recursos locais, o dinheiro circula no município ou no estado. Esse é um dos trabalhos mais difíceis.


A pesquisa mostrou que 44% das cervejarias foram abertas nos últimos três anos. Esse dado indica uma renovação do setor e um potencial para crescimento?
Esse movimento que vem acontecendo de maneira surpreendente no Brasil é uma realidade que também ocorre em outros países. Se olharmos para a pesquisa do Mapa de 2017, tínhamos 679 cervejarias, e em 2021, eram 1.549. Então, o salto tem sido muito grande, e estamos sempre falando de crescimento de dois dígitos, ano após ano. Esse movimento também acontece em outros segmentos, como embutidos, queijos, café e até mesmo na agricultura. No Brasil, vemos queijos maravilhosos, em um crescimento explosivo. O mercado tem um potencial real. Podemos falar de mercados não explorados pelo artesanal. E o artesanal não precisa ser extremo, ele pode ser uma cerveja bem equilibrada. Se pegarmos o exemplo da comunidade do Grajaú, em São Paulo, onde nosso colega Leandro Sequelle tem a Graja Beer, lá tem 1,5 milhão de habitantes. E se tivéssemos uma fábrica de cerveja Pilsen lá, tenho certeza de que surpreenderia a todos pela experiência, e poderia ter preços bastante competitivos. Tem o Norte e o Nordeste do Brasil com potencial incrível, pois são lugares de clima quente, com muito turismo. Abrir uma cervejaria nesses lugares seria um ótimo negócio. Eu vejo que o crescimento continuará.

O que precisa acontecer para esse crescimento ser mais saudável? Que tipo de apoio esses empreendedores iniciantes devem ter?
Essas pessoas precisam de ajuda, de união, de informações técnicas, de equipamentos. E tudo isso está acontecendo. O mercado de equipamentos e importação de insumos está crescendo. Uma coisa que eu particularmente não acreditava era o aumento do plantio de lúpulo no Brasil. Torço muito por esses malucos que estão plantando lúpulo. Para mim, eles são heróis, o plantio de lúpulo está aumentando de forma organizada. Então, vejo isso com otimismo. Também precisamos melhorar muito internamente para que essas cervejarias sejam financeiramente sustentáveis e continuem existindo, evitando grandes fechamentos. Nos Estados Unidos, temos entre 10,5 mil e 11 mil cervejarias, enquanto no Brasil estamos em torno de 1.500. Ou seja, acredito que ainda há muito mercado a ser descoberto aqui. O segmento das cervejas especiais, que inclui as artesanais, tende a aumentar. Estamos aqui para colaborar. O trabalho também mostrou que 44% das cervejarias foram abertas nos últimos três anos. Isso é uma realidade muito forte e indica um crescimento significativo no setor cervejeiro. É uma luta incessante, mas acredito que, com união, apoio e melhorias internas, as cervejarias artesanais têm um potencial promissor para se manterem e prosperarem no mercado.

A pesquisa indica que a maioria das cervejarias conseguiu aumentar o volume de cerveja vendida de 2021 para 2022. Isso é um sinal de recuperação do setor?
A pandemia trouxe muitos desafios para as cervejarias. No início, elas perderam seus clientes devido ao fechamento de estabelecimentos. O delivery se tornou uma alternativa importante, tanto como uma questão de sobrevivência quanto de motivação. Muitas cervejarias tiveram que lidar com preocupações envolvendo seus estoques de cerveja e a incerteza sobre a validade dos produtos durante o período de lockdown. No entanto, com o retorno gradual das atividades e eventos, houve um aumento significativo nas vendas no ano passado. As pessoas estavam ansiosas para sair de casa, encontrar amigos e desfrutar de uma cerveja. Eventos como carnaval fora de época, festas juninas e até mesmo uma Copa do Mundo no final do ano impulsionaram esse crescimento. No entanto, é importante mencionar que houve um aumento considerável nos insumos, mas esse aumento de custos não foi repassado totalmente para o consumidor. Isso resultou em margens de lucro ainda mais estreitas para as cervejarias. Portanto, o ano de 2022 foi um ano de desafios, e acredito que 2023 será o ano da retomada. Manter os volumes de faturamento e produção, além de encontrar maneiras de equilibrar as contas, são alguns dos grandes desafios para este ano. Embora as vendas tenham aumentado, a margem de lucro ficou comprometida devido aos aumentos nos insumos. É importante buscar estratégias para enfrentar esses desafios e garantir a sustentabilidade financeira das cervejarias.

81% dos participantes da pesquisa disseram esperar que 2023 será melhor do que 2022. O que você acha desse dado? Quais são as oportunidades e desafios para esse ano?
O brasileiro é um otimista e tem um mercado a ser descoberto. Então, esses 3% de participação de mercado vai aumentar, porque cresceu muito o número de cervejarias. Há a oportunidade de ter uma reforma tributária que vai levar de cinco a sete anos, é uma transição que vai acontecer aos poucos, mas, quando você piscar os olhos, já se passaram cinco anos. Temos uma oportunidade de defender o nosso segmento com redução de impostos a nível estadual e federal. E precisamos levar essa informação para os nossos associados. Acho que o momento está propício para se falar de impostos e pleitear redução para as artesanais. E enquanto associação, temos um projeto olhando todo o Brasil. A associação vai iniciar um projeto chamado Conexão Cerveja Brasil, que passará pelas cinco regiões do país.

Quais são as atrações preparadas pela Abracerva para o Conexão Cerveja Brasil?
Nós teremos um congresso, no qual vamos abordar pautas tributárias, vamos falar de produção, de malte, de lúpulo, de levedura. Nós vamos ter pautas de sustentabilidade, também vamos falar sobre a pauta de diversidade. Além do congresso, tem o campeonato, vai voltar a Copa Cerveja Brasil. Será a terceira edição, a primeira sobre essa nova gestão. É uma oportunidade para as cervejarias serem premiadas e de terem um reconhecimento regional, pois é muito difícil para uma cervejaria do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste concorrer em Blumenau ou nos eventos da Brasil Beer Cup, que têm um nível altíssimo. E queremos valorizar o local. Isso é um norte do nosso segmento. Também teremos o festival, que não terá investimento antecipado das cervejarias, pois a Meu Chopp, nossa parceira, vai bancar o custo de locação. Queremos fazer eventos simples, com entregas realistas, diminuindo o risco financeiro.

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